domingo, 4 de agosto de 2013

O meio


Uma história é sempre o meio: não há como ser início nem final. É certo que toda história tem seu começo e seu término, mas não passa disso: é o seu, não o de um todo.
Tomo por exemplo Mrs Dalloway, espécime perfeita para uma analogia. O romance se dá início com a decisão de comprar flores numa manhã quente de julho e termina na noite do mesmo dia. Mrs Dalloway tem ai seu começo e seu final, mas é o meio de uma história tão maior, uma história apenas percebida – nunca contada. Há o dia em que Dalloway decidiu fazer uma festa, há o momento em que Peter Walsh voltou da Índia, haverá um enterro, por certo, que nunca nos será mostrado; não por Woolf. Talvez por nós mesmos, se o quisermos. E qual leitor, por mais atento, por mais Cândido que seja, saberá daquele beijo proibido num navio e da moça que o sofreu? Porque tal beijo é parte de outro meio – outra história que por acaso nos foi contada¹.
Literatura, assim vista, não constituída de inícios e fins mas de meios contínuos, se mostra irmã da realidade; talvez a arte menos arte de todas, por querer ser crua e cruel como a própria vida. E como na vida, sabe-se tão pouco de tanta coisa e de tanta gente que nos resta preencher lacunas com interpretações. Afinal, não dispomos da visão do todo, nunca; seja em vida ou em literatura.
Nem mesmo Joyce e Sabino, entre retratos e encontros, narrando começos ou finais, saberiam o paradeiro de todos os seus filhos imateriais. Um deles, muitos deles se perdem no meio em que estavam e vão criando seus começos. Literatura se torna viva desse jeito. Personagens se tocam e se repelem, e o bom leitor sabe que a boa história pesa porque é densa demais para suas próprias páginas.
Beira a maldade – dão-nos só o Cristo, enquanto nos escondem Gênesis e Apocalipse. Contam-nos o meio, apenas; porque é só o que se tem para contar. Volto a Sabino, ainda que parcamente modificado: de tudo ficam três coisas: a certeza de que se está sempre começando, a certeza de que é preciso continuar e a certeza de que será interrompida antes de terminar.
Talvez por isso reneguemos o era uma vez ao passado. Hoje: era uma dentre tantas vezes.

Filhos da Letargia


Harlem Shake é o apogeu de uma sociedade que não sabe para quê existe; desconhece suas próprias razões e, inda mais grave, não se importa em procurá-las. Enfatizo que o ridículo dessa manifestação não me incomoda. Tzara e Ball foram, a seu modo e tempo, ridículos. Mas há quem duvide, hoje, de sua intenção rebelde e de seu valor artístico?
O ridículo que não desafia, que não constrange nem modifica atos é apenas uma distração passageira. Eu riria de Harlem shake; talvez até fizesse um Harlem Shake com os amigos loucos (e ridículos) que tenho. Mas há um problema, pois nossa civilização vem produzindo Harlem Shakes e Harlem Shakes. Apenas distrações que se espalham como uma doença, deixando-nos débeis e passivos. Ouso ir contra o discurso atual de que a internet criou produtores. Na verdade, parece que temos um exército de receptores-copiadores. Os produtores continuam poucos e regentes dos costumes, enquanto esses receptores-copiadores se sustentam na ilusão de criar e inovar. O Facebook, grande e velho Harlem Shake, ao qual tive o desprazer de usar por alguns anos, é um amontoado de repetição e humor desgraçado. A grande Ágora do mundo contemporâneo está mais para feira, tão bárbara com seus clientes que se autodenominam comerciantes, mas vendem produtos nada artesanais, efêmeros e de pouco valor.
Criamos uma era letárgica e preguiçosa, que teimosamente insiste em se mostrar revolucionária e ousada. De Masi, em seu Ócio Criativo, prevê que o tempo livre há de se tornar mais presente em nossas vidas. Segue dizendo que, devido a industrialização e – aqui acrescento eu – futura robotização da produção, restará para os humanos se ocupar com o criativo, com a arte e o lazer.
Mas com Harlem Shakes não estamos sendo criativos, não fazemos arte e nem mesmo criamos formas duradouras e proveitosas de lazer. E para quem vier me dizer – A internet está repleta de coisas maravilhosas e que podem fazer a diferença! – concordo. No entanto, tem de se procurar por essas maravilhas com tanta minúcia, nos guetos dessa viela chamada internet. Ainda, por outro lado, nos afogamos no que se repete, e o que é ruim e sem valor, este surge bem na nossa cara, nos atropela. Não procurei Harlem Shake, me impuseram Harlem Shake. Vi porque já não havia como ignorar, mas gostei de ter visto porque o buraco da mediocridade que estamos lentamente cavando apareceu, finalmente, para mim.
Espero não cair nele; se já, lancem-me uma corda.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Só sei dançar com você


O som da televisão preenchia a sala melhor que qualquer conversa. Conversa é ruído e uma jornalista tão bonita certamente não tocaria em assuntos desagradáveis. Uma tragédia aqui, um imposto extra, que seja; nada próximo, nada que traga à barriga aquele desconforto de uma situação real. Renan olhava para a jornalista e se apagava a ela. Era sua prostituta, estava ali para dar prazer momentâneo e partir assim que ele gozasse. Riu da própria ideia. Imaginou a loira plástica na cama, satisfazendo suas vontades. O sexo terminaria num boa noite jornalístico. Quis compartilhar a piada com o irmão, mas se lembrou de que ela não seria engraçada para Rui. Rui não levaria a loira para a cama, afinal de contas. Talvez se convertesse a comparação para encaixar o jornalista? Sentiu aquele desconforto na barriga. Decidiu acompanhar o noticiário calado. Incêndio em boate já fez mais de duzentas vítimas, e outras trinta estão em estado grave. Rui fungou, e Renan ajeitou o travesseiro em resposta.  Estava deitado no sofá, de frente a televisão. O irmão sentava no chão, encostado na parede. Via as imagens no aparelho e não conseguia juntar as coisas pra que fizessem sentido. Tentou várias vezes fazer piada com alguém da TV; sabia que Renan era fácil em rir. Não conseguiu, no entanto. Cardiais se reúnem para a eleição de um novo Papa e...

- papa-anjo, só se for. – e tentou olhar para Rui, sentado no chão.

Riram. Não como antes; nada seria como antes. Renan não tocaria o irmão por um bom tempo. Seria estranho, não seria? Dois homens se tocando. Antes eram dois irmãos, agora dois homens. Era assim que Renan se comunicava melhor, sentindo a pele – não mais com Rui. Tudo havia mudado. O contato deveria ser por palavras, nada mais. Só dessa forma não despertaria coisas desagradáveis no irmão. Dois homens se tocando. O estômago de Renan parecia diminuir, a sensação na barriga mais forte. Rui sabia que o silêncio do irmão era anormal, e aquele sorriso também. Tentou imaginar os absurdos que perpassava agora a mente dele. Atrocidades, com certeza. Renan sempre demonstrara um falso respeito com gente feito Rui, mas na intimidade usava piadas para deixar claro sua opinião sobre as coisas. Tinha asco, e agora com certeza tudo estava direcionado para Rui, o exemplar mais próximo. Próximo demais, na verdade. O jornalista tinha cabelos grisalhos, Renan observou, mas não era velho. Havia algo forte em sua aparência, talvez pela forma da mandíbula tão bem desenhada. Pensou em perguntar a Rui o que achava dele. Do jornalista, não dele-Renan. Afinal eram irmãos; irmãos não acham nada um do outro. Não deveriam achar. Rui achava o irmão mais velho muito mais esperto e obstinado. Admirava isso e, muitas vezes, invejava. Queria conseguir terminar as coisas como ele terminava. Renan mal tinha vinte e já carregava um diploma de técnico em mecânica. Enquanto isso, Rui ainda tentava decidir qual curso seguir na faculdade – Letras ou Geografia.  INP divulga lista dos cursos do futuro – engenharia e tecnologia dominam lista. Rui riu com a coincidência e com o seu belo futuro. Renan olhou para baixa mais uma vez, e não riu junto. Rui era confuso, mas era o mais bonito dos dois. Renan franziu o cenho ao chegar a essa conclusão. Eles eram parecidos, mas o mais novo sempre chamara a atenção das garotas na escola. De fato deveria ter suspeitado de tudo muito tempo atrás; Rui sempre as rejeitou carinhosamente. Havia confusão na sua mente. Olhou novamente para baixo, de testa franzida, absorto em seus pensamentos.
- O que?
- Disse nada – respondeu Renan.
- Então olha ai pra TV – e atirou no irmão as gotas de água que restavam em um copo ao seu lado.
- Viado – xingou Renan, rindo e limpando o rosto.  – Desculpa. Não quis...
Rui balançou a cabeça e fingiu jogar mais água.
- Sem bronca.
Ainda se olhando, os dois finalmente se viram. Poucas coisas poderiam separar os dois; talvez nada, até. Renan levantou com o travesseiro na mão – cara de mau.
- Tem bronca sim, cara.
Rui escondeu o rosto nos joelhos dobrados, rindo e xingando enquanto Renan tentava puxá-lo para sufocá-lo no travesseiro. Rui tentou, mas o outro sempre fora mais forte.  Finalmente ergueu a cabeça, lacrimejando de riso. Parou quando sentiu os lábios de Renan tocarem os seus. Por sete segundos seu coração fez mais barulho que a TV.
- Sem bronca – Rui falou enquanto seu irmão o olhava ainda de lábios úmidos.

Amanda


Amanda era louca. Louca de pedra mesmo. Você não faz ideia o quanto. Ela nunca foi internada porque ninguém foi capaz de enfiá-la na ambulância. Da última vez que tentaram, ela agarrou na porta e ficou se balançando enquanto guinchava feito macaco. Uaaaaaa, uaa-a-aa.  Às vezes Amanda achava que era um macaco de verdade, um desses mais miúdos e ágeis. Ela saia pela rua, pulando nua, parando nas calçadas para se coçar e rir. Ria muito, ela. Mostrava os dentes com frequência pras crianças da vizinhança, que saiam a imitá-la, mas logo cansavam. Amanda só cansou de ser macaco quando descobriu que podia voar.

Era louca, a garota. Mas fiquei feliz quando a vi bater os bracinhos magros e sumir entre as nuvens. 

Poemanjos

Alguns poemas são como anjos da guarda. São poemanjos. O meu é, sem dúvida, Rimance do Sofrimento, de Menotti del Picchia. Ele, assim como todos os poemanjos, diz tanto sobre o seu 'protegido' que chega a ser constrangedor compartilhá-lo com outros.

Poemanjos não precisam ser explícitos. De preferência, que não sejam. Acredito que, de tão profundos e verdadeiros que são, podem confundir os observadores. Alguém pode dizer ao meu poemanjo: "mas isso não faz sentido! Não está falando do Yuri que eu conheço". Então, se isso acontecer, é porque não me conhecem tão bem quanto ele.  Conhecem aquilo que eu quero, que eu posso mostrar. E só.


quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Ao mestre Caeiro, com carinho

A flor que em meu jardim
nasceu nada me diz.
mas tu me dizes que meu jardim
n'é meu. E que a flor
                           [que não é minha, nem dela própria]
nada quer me dizer, porque nada
diz a ninguém.

quero ouvi-la, Caeiro
mas vejo e só vejo
e não me é satisfatório observar
apenas. E sei que para ti
ver é tudo que se pode ter.

mas e a cor da flor?
não há? Tal qual a borboleta que
é só [e isso é muito] uma borboleta?

deixaste-me confusa, Caeiro
tão confusa com tua falta de filosofia
tua profunda e complexa simplicidade de ver
o que se pode ver e nada mais.

talvez não te entenda, como não entendo
muito na vida
              [na minha vida e na dos outros]
e por isso sou sofrida e cansada
sou falsa poeta
                     [poetisa, Caeiro?]
porque quero que minha flor
não, a flor da flor dela mesma,
me dirija sua palavra suave e me
acalente e me guarde.

Caeiro, em tua paz e indiferença pacífica
me destruístes e estou ainda a me remontar,
mas dançarei sobre tua cova após a missa ao orixá
e a homenagem da flor a ti será
somente um silêncio respeitoso.

Manoela Hister




domingo, 7 de outubro de 2012

Asmaria

febril.
tossindo um monstro
que se recusa a sair.
fincado com seus
dentes de ar e
de ausência de ar.

Quem dera fosse
calor de amor,
suor de ardor
se o peito doesse
por um coração partido.

pulmão não é poético,
é profético:

grita morte,
lentamente morte,
devagar, quase sem ar.

as marias, todas elas,
chorarão por mim.
as marias da homeopatia.
as marias da psiquiatria.

somente elas,
as outras marias,
sorrirão,
levando o ar
que me restar. 

quinta-feira, 2 de agosto de 2012


quanta estranheza.
não entendo tua língua mas a desejo
e nem sei se a desejo como antes
antes dele te desejar depois
de mim.

quanto barulho
da minha própria boca suja
abraça ele amigo eu digo
mata ele eu digo
mas não digo.

mas tu sabe
e abraça e quer beijar
estranho tua língua já que
nunca a tive em mim.

só tua língua tua lábia
não teu lábio tua língua
estranheza que ninguém nunca entende.

poesia que ninguém vende
nem eu compro pra ti
tu não merece minha
minha estranheza
minha delicadeza rimada
sem rima delicada
sem nada.

drummond me ajuda querido
tô sem marido e criado
machado meu filho
sai do buraco
do furico do ouvidor

perdão amigo
é que perdi o rumo
sai da métrica pulei a rima
caí na cama caí na britz

estranheza.

meus pés sossegam e minha barba pede afago
meu cabelo é cacheado mas espera tu alisar
minha orelha é grande sim que mal tem
tem mais coisa aqui que é grande como ninguém

ah ginsberg safado
sai de mim salafrário
não sou teu cavalo
talvez tua égua quem sabe
ainda não me decidi
mas pra quê
vou morrer mais uma vez
já foram três querida sylvia
eu também sei contar
mas parece que tu venceu
mas chego lá

é meu destino meu wyrd
sou o próprio
o condenado
só não sou cristo coitado
não tô aqui de férias
vim só perambular

me ouve Avalokiteshvara
porque maria é virgem e não me quer
e satanás que me quer
não quero
porque a mulher que eu quero é homem
e o homem que me quer mulher

estranheza.

antes não era bom
agora sou pior
espero o fim curvado na cadeira

se passei sem tua língua
todo o resto passará

passará a me estranhar.






sexta-feira, 29 de junho de 2012

O Último dos Suicidas


Há uma estranha melancolia pairando no mundo. E o mundo cada vez mais vazio. Cada vez maior. Ontem minha mãe se foi, afogada. Antes dela, meu irmão. Meu pai dirige o carro nesse momento, chorando calado. Só há árvores lá fora passando como um só borrão verde. O carro vai rápido; o vírus vai mais rápido ainda.
A contaminação começou há dois meses em algum lugar na Suíça. Hoje não há mais ninguém lá. A Europa, de um modo geral, já não mais é. Oceania já não mais é. Ásia, África, América. Todos morremos pacificamente, porque não podemos lutar contra nossa própria vontade.

O ar cheira a desejo de morte. Para os contaminados, todo objeto é tentador. Toda dor é glória e se vai feliz. Isso é para mim o mais estranho nessa doença desconhecida: não há tristeza nem choro, só impulso. Por isso sei que dela ainda não sofro. Minha tristeza em ver o homem definhar é natural, e ainda choro. Meu pai dirige o carro, mas parou de chorar há cerca de uma hora. Mantém o olho fixo na estrada. Quase não pisca.

Acho que sou imune. Só isso explicaria a capacidade de permanecer em tão demorado contato com pessoas infectadas e não compartilhar do mesmo comportamento doentio. Na verdade, há duas semanas que presenciei o primeiro caso da doença. Desde então tenho visto toda sorte de manifestações. Tudo, no entanto, pareceu real quando meu irmão quebrou o espelho e tingiu o banheiro de sangue.

Meu pai parou o carro há quinze minutos. Não largou o volante, não me olhou. Somos dois, mas apenas eu estou aqui. Minha mãe resistiu a morte de meu irmão como uma guerreira, mas é disso que o virus se alimenta. Coragem, vontade. Talvez me falte naturalmente tais coisas, por isso sobrevivo.

Estou sozinho. Meu pai está no meio da pista molhada, em frente ao nosso carro, esperando que ele venha em sua direção. Cinco, dez minutos. A pouca consciência que ainda resta o alerta de que o fim não chegará por aquele meio. Saio andando em busca de sua fatalidade particular.

Eu saio do carro. Sinto que sou o último homem farfalhando na Terra. Sei que estou na mesma posição há vários minutos. Parado ao lado da porta aberta. Há um cansaço que pesa, que não me permite mover.

Não estou infectado por esse vírus. Não por esse. Parece que andei por quilômetros, ou simplesmente apareci no meio desta ponte. O vento é tão forte quanto eu. Quem dera eu sentisse a água uma última vez. Mas será tarde quando eu atingi-la. 

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Encontro

O que será que Ruth tanto olha? Ela é cega, afinal. Não vê nada. Mas seus olhos parecem fixos num ponto específico. Uma vez ouvi uma doutora explicar em sua tese o ponto vélico. Ruth talvez veja o ponto vélico que eu nunca vi. Bem que gostaria. Só há a fumaça do ônibus a frente, o espirro da moça gripada, as gotas de chuva na janela. 

Ruth não vê essas coisas. Ruth não anda de ônibus porque tem medo. Medo da fumaça, da gripe, da chuva. Já eu tenho medo do ponto. O vélico, de Ruth, que não enxergo; o ponto em que desço, o do ônibus, que também não enxergo. Mas estou próximo, e em breve deixarei de ser cego: verei aquele que nunca vi.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Bralon I

Somos nuvens que divergem na mesma direção.
- Assim, divergindo e se tocando e se soltando e se ferindo
e se afastando sem nunca se encontrar em chuva.

Nuvens imorais, sem vento que as empurre, sem Sol que as dilua.
(sem Lua, também, que as mistifique).

Está negra, a outra nuvem, pois se achou por certo em
outra nuvem e em breve choverá.

Nuvem eu, inda tão branca e perdida, se prepara,
se contorce de dor e terror, de amor, se possível é.

Choverei, e o sal de cada gota de meu sangue amargará e tingirá
o que restou do Éden.

E então venha o Dilúvio
para sempre me cobrir.


sexta-feira, 13 de abril de 2012


Choro ao Sol
para que as lágrimas
virem vento;
e a pele pálida
tome coragem.

E as bochechas se deformem
no sorriso de fingida felicidade.

Mas os olhos,
que não coram (mas choram),
permanecem para sempre
desbotados.

domingo, 15 de janeiro de 2012

Movirri, morrivi



Last Song from benjamin & stefan ramirez perez on Vimeo.



Movirri, morrivi

parei de ficar parada quando comecei a me mover
               [frase estúpida é poética aos olhos de quem lê]
aos olhos de quem vê não mais estou parada
me movo de novo sem querer
na direção errada

e não há nada que me impeça
            [nem mesmo a perna que tropeça]
de chegar ao precipício que me atrai
e oscilar,
vacilar na beira do cais
das almas que vivem sem mover.

movi e morri,
morrivi, movirri. 

Manoela Hister

sábado, 17 de setembro de 2011

Fractal
















Coração fragmentado, fractal
Plantei os teus pedaços
Como sementes de cristal.

Levada longe pelo vento
Só uma floresceu
Na terra seca e no breu
De uma rua qualquer.

Só espero que te colham
E te provem o aroma
Sem saber que fora outrora
Parte da chama
De um amor que já murchou,
De um coração que se quebrou.

Desenho de Vivi Cabral. 

domingo, 28 de agosto de 2011

Monstro



monstro de sangue e fel
de osso que reveste a carne, não o oposto
monstro que teme gente
e se protege na pena e papel
                          [na pena de si mesmo e no papel que representa]
e sente frio por ter o coração exposto
e porque os bons riem de ti
                          [porque são bons e isso basta]

monstro que chora de madrugada
mas se esgoela ao risos de manhã
enquanto te olham, inquietos
e se perguntam: quem é ele?
é o bicho que pari, ela diz
mas não é meu.
e tu se escondes
onde quer que vás
porque és profundo demais
ou vazio.

oco, monstro, de sentimentos fortes e verdadeiros
e se choras é pela dor imediata que sentes,
então aproveita e escreve!
porque é tão raro, não é?
mas o teu sofrer não importa
nem pra ti mesmo.
e se não sentes, logo como choras?
pois não darás de beber ao teu rosto com lágrimas falsas
nem darás de comer ao teu corpo com poesias vãs.
acabes logo com isso, monstro
e voltes para debaixo da cama deste pobre garoto
ao qual tu gozas possuir nas madrugadas.
vai, permita-o ser bom ao menos uma noite
ao menos esta noite, monstro
deixa-me.

sábado, 11 de junho de 2011

Homenagem anônima

nobre velha
caida na beira
do buraco da vida
sem mãe sem marido
sem cabelo
tronco forte
madeira ancestral
te vejo de longe
teu brilho constante
de luz

Noz, teu cérebro poético
Luz, tua ousadia de mulher

Diário

No meu diário
Não escrevo todo o dia
E nem mesmo todo dia
Só, assim, nos momentos de agonia
Quando a luta,
Dia a dia,
Trava a língua
E vem a língua
E trava luta
No papel.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Talvez

talvez eu seja um mau poeta, um mau contista, um mau vivente.
talvez eu seja um mau aluno, um mau colega, um mau crente.
talvez eu seja, talvez não.

talvez a mesa esteja posta pro almoço.
talvez o mundo seja o poço do desgosto.
talvez a faca escorregue no pescoço.
talvez sangre.

talvez chova ou faço sol.
talvez o peixe morda o anzol.
talvez já tenham desistido de me ler.
talvez enfim ele desista de viver.

talvez tome coragem, seja forte.
talvez vá adiante e se enforque.
talvez ao ver ninguém se importe.

talvez o mundo acabe amanhã
e as decisões se adiem para sempre.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Polêmica Linguística I

Há quase uma semana que rola polêmica sobre um livro didático do Português recentemente aprovado pelo MEC. O mais interessante é que os responsáveis por essa balbúrdia toda são, em sua maioria, aqueles que se julgam os 'transmissores de informação' no País. Eles mesmos, os jornalistas. 

O problema está em como essa informação é passada para o povo brasileiro e, ainda pior, como alguns formadores de opinião se erguem revoltados contra áreas e estudos que passam longe de suas especialidades. Ver Alexandre Garcia, jornalista inteligentíssimo, comentando sobre o livro didático "Por uma vida melhor" em plena rede nacional me deu medo. Primeiro porque Garcia é muito respeitado e sua opinião é [ou parece ser] muito bem recebida pela população. Segundo, e mais grave, porque ele discorre sobre algo que NÃO pode ser discorrido por um leigo sem que tenha por consequência final um monte de conceitos distorcidos e mal interpretados. O mínimo que uma emissora de TV, ou Rádio, ou um jornal impresso deveria fazer nesses momentos é pôr no ar um especialista [ou ainda melhor, VÁRIOS] que estivessem habilitados a falar sobre o assunto. Alexandre Garcia comentando Linguística é tão válido quanto eu [estudante de Letras] comentando sobre Economia ou alguma ação judicial. 

Mas há quem tenha feito coisa pior, dessa vez na Rádio CBN. O texto a seguir, que eu transcrevo por completo, foi enviado como uma carta à direção da referida rádio pelo Professor Antonio Carlos Xavier, professor titular de Linguística na Universidade Federal de Pernambuco, onde eu estudo. A carta é direta, concisa e muito, muito esclarecedora para quem nunca pegou um livro de Linguística, mas quer entender as motivações de toda essa polêmica. E de quebra, é engraçada em alguns momentos. Quer melhor?


E mais: para quem quiser ler a opinião de Marcos Bagno, linguista conhecido e estudado na maioria das universidades do País, é só ir em seu site pessoal www.marcosbagno.com.br e procurar o artigo "Polêmica ou ignorância?".


Segue agora a carta do Professor Xavier:

domingo, 17 de abril de 2011

Pecador

aos teus pés confessei-me
os meus pecados da mente.

ao teu ouvido sussurrei-me
os meus pecados da alma.

aos teus lábios consagrei-me
aos meus pecados da carne.

Mas havia apenas eu, e nenhum tu.

sábado, 31 de julho de 2010

Irreal

Cansei do mundo ao meu redor.
Cansei das regras sem explicação.
E das lutas eternas para ver
Quem segura o ar na mão.
Ninguém segura o ar na mão.

Prefiro o irreal, porque o real sempre se repete.
Há vida, riso e lágrima, dor amor e morte.
E só? É isso que se chama existência?
O universo conspirou com Deus para apenas isso?
Não basta para mim.
Se existir algo entre o riso e a lágrima,
Eu quero sentir.
Se há algo mais entre o amor e o ódio,
Eu quero descobrir.
Quero ver o que há após a morte.
E o que há antes da vida?!
Diante disso, o mundo que me foi apresentado é
Uma prostituta experiente,
Cujo corpo já foi por completo desvendado.
Mas o irreal é aquela moça virgem,
Frágil e besta,
Que desperta mais curiosidade que luxuria.

Assim é perfeito o irreal, porque é louco.
E aquilo que sai diferente é aclamado como igual.
E o igual jamais cansa, porque é sempre inovador.
E a cada página dessa vida, o sorriso é mais extenso
E a lágrima mais salgada.
E na hora da morte, ri-se.
Porque a aventura seguinte
será ainda mais
Surreal.

domingo, 27 de junho de 2010

Twitter, Orkut e uma problemática social

Talvez quem ler esse post alguém lê?, não concorde comigo. Mas eu vou dizer assim mesmo, porque isso é um cortiço, e como todo mundo sabe em cortiços as opiniões são variadas e as roupas sujas são lavadas no tanque público!

So let's go!

Eu andei observando certas situações no Twitter que me fizeram pensar. Que situações? Bem, o Twitter começa a girar em torno de celebridades e subs. Não sei o motivo[talvez eu sabia, só que seria demorado pra explicar], mas os famosos pegaram gosto por essa rede social como não pegaram por nenhuma outra.
Mas tá certo, qual o problema de gente que 'a gente' admira estar no Twitter? Nenhum, se eles não se tornassem o motivo de você, ou eu, ter um Twitter também! Ou se muitos deles não monopolizassem os assuntos e até os TT's.
Já vi muitas vezes personagens famosos escrevem coisas desse jeito: " gente, vamos colocar '&%¨%*&' no TTbr!" e pronto! Já é suficiente pra um exército de seguidores dá RT, comentar, responder e, claro, colocar nos TTs!

Outra situação é que, talvez inspirados por esses famosos que só seguem outros famosos, muitos ANÔNIMOS adquirem o costume de não seguir quem o está seguindo! A histórinha antiga do 'me segue que eu te sigo' acabou, agora a moda é 'me segue, que eu me finjo de famoso e te ignoro'.
Seguir mais que ser seguido agora é uma coisa feia, faz de você um...sei lá, um pé-rapado?!
Lembre-se gente: Twitter é uma rede social, não uma central de fãs. Você pode sim seguir seu ídolo [ eu mesmo sigo Joe Penna, e Switchfoot!], mas isso não faz de você um ser superior a ponto de ignorar quem não seja do mundo televisivo ou youtuber.

Em contraponto, tá o Orkut. Se o Twitter tá se centralizando em torno dos famosos, o Orkut começa a girar em torno de pessoas sem noção alguma! Tô mentindo?
Dá uma olhada: http://www.tolicesdoorkut.com/
E outra olhada: http://www.perolasdoorkut.com.br/
E se você pensar que isso tudo é muito distante do seu mundo virtual, dá uma reparada geral nos seus amigos do orkut que você vai encontrar uma criatura dessas! E vai dizer que nunca recebeu um convite de um sem noção pedindo pra te adicionar?

Diante desses probleminhas, fazer o quê? O Twitter já me tem como cativo, o Orkut já nem tanto, mas ainda assim tenho pena de excluir uma conta tão antiga. A gente vai vivendo: driblando ou aceitando essas coisas.

God bless the Blog!

Bem, é isso!

terça-feira, 22 de junho de 2010

Música, Switchfoot, Matt Costa e Coralie

Hoje estou a fim de falar sobre música. Vou tentar ser bem específico, porque eu sou muuuito eclético e vivo por fases musicais. Sendo assim, passo às vezes uma única semana curtindo uma só música,  e então, na outra semana, já a esqueci quase que por completo.

Pra evitar uma tremenda confusão na minha sua cabeça, vou falar daquelas músicas/bandas que têm um espaço sagrado no meu iTouch. So Let's go!

Number One! 



Quem me conheçe já deve ter me visto falando dos caras. Sou loooouco pela banda, tenho mais de 80 músicas no pc, e umas 70 no iTouch.
A gente tá até tentando traze-los pra cá com uma campanha no Twitter e no Facebook. Se a gente conseguir, Meldelz, vou ter que arrumar grana pra ir pra São Paulo!


Minha música preferida ever:
24 - Clipe não oficial:


Amo *-*

Number Two!

Matt Costa!!!
Conheci pela MTV, num daqueles clipes aleatórios que eles passam vez ou outra. Lembro bem: eu tava destraido com uma coisa qualquer [como sempre], e ai ouvi a música Cold December e pronto. Foi paixão à primeira vista. Corri pra baixar, e hoje tenho a discografia completa do cidadão!
Sabe o que é interessante? Os garotos de Switchfoot são surfistas e Matt costa era é skatista! Dois mundos completamentes distantes do meu, mas estamos unidos pelo mesmo tipo musical.

Definir uma música de Matt para 'preferida' é difícil. Mas, entre tantas, vá lá:

Whiskey and Wine:


E também:
Shimmering Fields:



Numéro trois!



 Coralie Clement é recente nas minhas listas, mas já é uma das minhas favoritas. Sou apaixonado por música francesa [diz-se Edith Piaf, Charles Aznavour, Laforret Marie...]. Mas Coralie é...Diferente.
Suas músicas vão do pop ao samba[!], passando pelo rock [!!] mas sem perder o toque 'francês' de ser. Exótico, não?


Mas vamos lá. Minhas chansons préférées:



 Indecise:


E..

La Mar Opale:


*-*

Também tenho uma paixão por trilhas sonoras, sabe? Em geral as que são instrumentais. Mas prefiro omiti-las daqui por enquanto. Quem sabe depois elas apareçam.

Bem, é isso!

sábado, 19 de junho de 2010

Orkut, Xadrez e Saramago

Hoje, ao abrir o Orkut e ir para a minha página de recados, vejo o seguinte:
"Uma vez me disseram que obras desses escritores os deixam imortais, mas pq vc pede que eles não morram?"

A pergunta feita por Orlando, grande amigo meu,  foi motivada pela minha afirmação no status do site:

"Moacyr Scliar, Ursula K. Le Guin, Fernando Veríssimo! Não morram, por favor! Ou só nos restará Stephanie Meyer, Mag Cabot e Paulo Coelho..."

Disse isso porque tentava exprimir o que senti ao saber da morte de José Saramago. Dizer que foi um vazio seria demais, já que li apenas um livro dele, As Intermitências da Morte. Mas algo me tocou profundamente porque Saramago representava algo maior que a literatura. 
Ele representava uma cultura intelectual , um poder de pensamento que se extingue cada vez mais rápido nesses dias. Com sua morte, parece que o mundo deu um solta muito alto à total futilidade.
Claro, você diz que isso é exagero! Intelectuais há muitos por aqui, gente inteligente é o que não falta! 
Mas Saramago era de uma visibilidade tremenda! Até aqueles que não tinham contato com literatura alguma o conheciam. 

Isso, para mim, significa mais uma perda de visibilidade para o mundo literario. 
Imagine um jogo de xadrez onde há pessoas que pensam versus pessoas que 'tem'. Entenda por 'tem', os famosos, as celebridades, os ricos e belos habitantes da Tv. Ou seja, as pessoas que tem dinheiro, beleza e fama, mas não pensam.
Enquanto o time dos 'tem' avança cada vez mais no tabuleiro, conquistando fãs ensandecidos, popularidade global e espaço, os que pensam perdem campo. Porque são tachados de chatos, monótonos e hipócritas. 


E então voltamos para o começo do post:
"Uma vez me disseram que obras desses escritores os deixam imortais, mas pq vc pede que eles não morram?"

Porque enquanto eles vivem, eles criam!
Após a morte eles vivem sim em suas obras, mas estão cristalizados nelas. Eles não produzem mais nada, a não ser inspiração naqueles que os leem.
Enquanto isso, aparecem a cada dia mais e mais escritores do tipo que se preocupa mais com a vendagem do que com o sentido que a história possa ter.
E mais uma vez no tabuleiro o time dos que pensam sai perdendo. Porque além da Tv, de boa parte da internet, de revistas e até o rádio, surgem agora livros sem conteúdo.
Livros que não fazem mais raciocinar, só desejar.

É por isso que eu pedi para Moacyr Scliar, Ursula Le Guin e Veríssímo não morrerem. Foi uma tentativa metafórica de preservar aquilo que eu acho importante. Porque tenho medo que ninguém venha os substituir. E eu, e muitos outros, estejamos condenados à total futilidade literaria.

Sem mais, um grande adeus a Saramago.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Maior idade, futuro e cortiços

Há dois dias sou legalmente 'maior de idade'. Me pergunto se algo deveria ter mudado... É óbvio que não!
Um documento nada diz sobre quem ou que você é, apenas te numera e classifica entre tantas pessoas que estão por ai.
Pois esse tal de documento dizia o contrário, mas eu há bastante tempo que me considerava 'de maior'.

17 anos não era muita coisa, eu sei. Ainda assim eu vivi, li, vi e ouvi coisas que preencheram minha cabeça, lotando-a de experiências positivas e negativas.
Mas talvez pela simples ideia de, ao menos no âmbito legal, ser completamente independente aos 18, me deu um frio na barriga.
Pois bem, veio o fatídico dia 15 de junho de 2010! Foi um dia maravilhoso, com pessoas que eu amo muuuito e a vitória do Brasil, mesmo que tão sem sal quanto foi. À noite, eu dormia pela primeira vez como um adulto.

Agora resta esperar o que virá. A resposta definitiva do Alistamento é em Julho, a Faculdade em Agosto e as eleições em Outubro. Um novo mundo se abrindo.

Um mundo para eu viver, ler, ver e ouvir. E juntar tudo isso num grande cortiço. O Meu Cortiço.